— Estou exausto.
             Leonard se remexeu na cama devagar, tomando cuidado para não me tocar. Sem tirar os olhos da minha leitura, balancei a cabeça em afirmativa. 
             — Eu também. 
             — Amanhã vai ser um grande dia. 
             — Eu sei. Acho que está na hora de dormir, não? 
         Silêncio. Piscando os olhos devagar, encostei o livro em meu peito, deixando claro que estava disposta a conversar. Eu estava disposta a ser interrompida - disposta a fazer qualquer coisa. Qualquer coisa. 
           Mas, como de costume, ele continuou olhando para o teto. Suas mãos, firmes como pedras, estavam longe das minhas. Mesmo lado a lado, era palpável o abismo que se formava lentamente entre nós. Suspirei. 
             — Querida?  — disse ele numa voz afetada. — Boa noite. — então uma pausa, como se quisesse dizer alguma coisa. — Te amo. 
             — Também te amo. 
             As luzes foram apagadas. Com a minha visão periférica, pude perceber que Leonard continuava de olhos abertos, ainda imóvel. Inerte em seus próprios pensamentos, ele nem reparou quando levei a mão esquerda até o rosto para enxugar uma lágrima que descia lentamente. 
             "Te amo". Quando foi que abolimos o sujeito dessa frase tão importante? Quando é que deixamos de lado o nosso amor?  Desde quando o "eu te amo" deu lugar à algo tão fajuto? São ótimas questões. E Leonard não parecia se importar - muito pelo contrário. É fato que ele sempre esteve lá "por mim" quando"precisei": sua carcaça me acompanhou à jantares de negócios, reuniões familiares, encontros casuais entre vizinhos e amigos. Mas era só. Ali, na cama, quando nossas almas deveriam se entrelaçar em momentos recheados de magia e intimidade, ele sempre se mostrava distante. 
             "Como foi o seu dia?"
             "E aí, tudo bem?"
             "Bom trabalho" 
             Frases soltas e desconexas que dizíamos um para o outro todos os dias. Mesmo sem querer saber a resposta, mesmo sem querer realmente dizer aquilo - assim se resumia o nosso casamento.
             Fechei os olhos e, forçando-me a dormir, tive a sensação que estava completamente sozinha. 
             O que talvez fosse verdade. 


(Emma) 

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QUEM ESCREVEU?

Iule Karalkovas
30 anos. Tem um gato chamado Alycia. Sonhadora, poeta, crítica. Ama escrever. Começou o VIDA E ÓCIO em 2012 e até hoje mantém postagens não tão regulares.

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