Na quinta-feira, quando Fernando convidou Carlos para a festa, é claro que ele não aceitou de primeira. Inventou uma desculpa, dizendo estar ocupado. Mas, não adiantou: ele estava ''devendo uma'' para Fernando. Então, no sábado, Carlos se arrumou contra vontade e foi para festa. Chegando lá, percebeu que ele estava em um lugar estranho, com pessoas estranhas que usavam roupas estranhas e comiam e bebiam coisas estranhas. Catástrofe

Mas nem tudo estava tão ruim assim. Enquanto o seu amigo enchia a cara, Carlos estava provando o melhor bolinho de arroz que já comera em sua vida - e aquilo não era exagero. Custou admitir que eles eram melhores até que os da sua mãe (ao pensar nisso, ele até pediu desculpas mentalmente para ela). 

Depois de terminar os bolinhos que estavam em seu prato, Carlos começou a reparar nas pessoas que estavam ao seu lado. Aquela festa estava cheia demais. Barulhenta demais. Era estranho para ele estar num lugar daquele, mas é claro que estranho mesmo era ele ser amigo de uma pessoa como  o Fernando, que, apesar de estar longe de ser popular, tinha lá os seus contatos - enquanto os únicos contatos que Carlos tinha em sua agenda telefônica eram os números dos seus pais.

Meia noite e meia. Fernando estava embriagado. Carlos estava quase dormindo sentado. 

"Quando é que a gente vai embora?''

''Quando é que você vai aproveitar a festa?''

''Fernando. Quantas vezes eu vou ter que dizer que...''

"Shhh... olha ali!" 

''O que?''

''Carlos? Carlos, você está vendo aquela gatinha ali? Meu deus... que diabos! Quem é aquela?'' 

Carlos olhou para onde Fernando estava apontando. Ao lado de dois garotos que mais pareciam criados, estava uma mulher de costas. Ao se virar, ele a reconheceu. A morena vestia um vestido preto justo e tinha os cabelos ondulados presos em um rabo de cavalo mal feito. Era ela. 

"Danna''

Fernando quase engasgou. 

"Como é que você conhece ela, seu putinho?''

"Cale a boca Fernando''

''É sério. Dá onde tu conhece ela?''

''Danna estudou comigo. Sexta série. Ela usava óculos. E aparelho''

Fernando quase engasgou de novo. Depois de alguns segundos, levantou-se com um sorriso bobo no rosto. 

''Vamos até lá. Que tal? Você pode me apresentar ela e...''

''Que tal a gente ir embora?''. Carlos disse, sem paciência. ''Sabe como é. Eu acho que ela não faz o meu tipo... e nem o seu'', continuou, olhando para as próprias roupas amassadas. ''Isso foi no passado. Agora dá para ver o que ela se tornou e...''

''Para de drama, seu idiota. Levanta essa bunda gorda daí e vamos até lá''

"Mas eu nem sou gord...''.

Antes que pudesse protestar, o amigo já estava caminhando em direção da morena e seus dois lacaios. Isso era suicídio. Pessoas como Fernando eram solteiras porque raramente conseguiam atingir um nível aceitável de popularidade, enquanto pessoas como Danna eram descoladas e cheias de admiradores. 

E Carlos? Carlos era uma pessoa normal, sem nenhuma qualidade extraordinária ou relevante. Pessoas como ele costumavam nadar contra a correnteza, boiando pelas bordas da realidade - apenas esperando o momento certo de afundar. 

Fernando já estava à cinco passos de Danna. Ela não se mexeu - estava ocupada demais falando sobre as roupas das outras pessoas da festa. Era agora ou nunca. 

Sem pensar duas vezes, ele se levantou e caminhou rapidamente em direção ao que pensava ser o seu destino.

QUEM ESCREVEU?

Iule Karalkovas
30 anos. Tem um gato chamado Alycia. Sonhadora, poeta, crítica. Ama escrever. Começou o VIDA E ÓCIO em 2012 e até hoje mantém postagens não tão regulares.

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