Ainda lembro daquele primeiro beijo. Ainda lembro da sua boca contra a minha, e daquele sorriso que se formou em seus lábios enquanto eu falava algo pervertido. Eu sei que você não se lembra, mas eu lembro. Eu lembro daquela sala vazia, e de todas aquelas carteiras brancas, desarrumadas. Eu lembro do medo e do desejo que queimavam o meu peito, se espalhando lentamente pelo corpo. Sabe do que mais eu lembro? Lembro das suas sobrancelhas erguidas quando eu fugi dos seus lábios pela primeira vez... eu sei que aquilo se tornaria uma brincadeira nossa - algo que você odiaria mais tarde - mas, naquele momento, lembro que o meu coração ardeu de alegria.

Aquele fim de tarde, aquela manhã no terminal. Uma sandália quebrada, risadas pelo corredor. Olhares nas escadas, mordidas de lábios na janela. Minha cabeça no seu ombro, um lamento vindo do fundo do peito. Uma tentativa de beijo roubado. "Desculpa, mas eu estou com ela". Seu mundo cheio de cor. Madrugadas alegres e muitas mensagens trocadas, chamadas pelo computador. Sofá. Medo, covardia, dor. Lágrimas que manchavam aquela sua velha camisa preta. Seu choro sentido pelo telefone. "Por que você fez aquilo? Você não sabe o quanto aquilo me magoou".

Lembranças. Você ao menos sabe? Você bagunçou o meu mundo. Fez com que eu desejasse ser melhor. Tive que encontrar um meio termo entre o fácil e o difícil. Minha cola, minha tesoura, minha válvula de escape, meu sal. Meu positivo, meu negativo. E, apesar de ter sido tudo isso, não foi nada. Entende o que eu quero dizer?

Eu tentei mostrar o que eu tinha de melhor. Queria mudar para que eu pudesse transformar o seu mundo - assim como você transformou o meu. Mas foi impossível. Foi impossível me desapegar do passado, esquecer certas lembranças. E isso acabou com tudo. Acabou comigo. Acabou conosco. E sabe do que me lembro, então? Eu lembro que isso fez com que a nossa história nunca terminasse. Nós éramos amantes, e não namoradas. E é exatamente disso que eu me arrependo - eu nunca cheguei a dizer aquelas três palavrinhas... e elas ficaram aqui dentro de mim por muito tempo. Muito, muito tempo. 

Três tentativas. O seu coração partido por duas vezes. Eu me quebrando por inteira naquela sexta-feira. O sol se escondendo de mim, a rua vazia... e eu não conseguia entender. Tive que te deixar para que todas essas coisas ficassem no passado. Tive que esmagar os meus sentimentos com as minhas próprias mãos - tive que provar do meu próprio veneno.

Porque você... você enfim se rendeu. Você encontrou um novo amor. Você encontrou alguém que te amasse acima de todas essas coisas. E, agora, você está sentindo por ela todas as coisas que um dia eu senti por você.

Estou mundo melancólica, não é? Tudo bem, eu fico assim ás vezes. Enfim, eu gostaria de dizer que, se um dia você voltar para aquelas carteiras vazias, lembre-se do que tivemos. Você sabe, deixei algumas partes de mim lá dentro, e se por acaso você as achar, deixe-as onde estão. Elas não são mais úteis.

QUEM ESCREVEU?

Iule Karalkovas
30 anos. Tem um gato chamado Alycia. Sonhadora, poeta, crítica. Ama escrever. Começou o VIDA E ÓCIO em 2012 e até hoje mantém postagens não tão regulares.

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